Nas Fronteiras da Lei
Desde a tomada de posse de Donald Trump como Presidente dos Estados Unidos da América (EUA), que o mundo tem vindo a assistir a uma inaudita demonstração de força da nova administração, quer no plano interno, cortando a eito serviços, departamentos e políticas públicas, quer no plano externo, suprimindo instrumentos de cooperação política e diplomática e injetando a incerteza nos mercados globais, através de avanços e recuos nas tarifas aplicadas às importações.
A democracia americana é complexa e relativamente robusta, pelo que muitas das ordens executivas do novo Presidente terão um impacto menor do que o fogo fátuo que geram, mas a agitação, o medo e a imprevisibilidade são em si mesmas armas brutais de projeção de força nas fronteiras da lei.
Sobre o comportamento de Trump e os seus objetivos existem muitas teorias, que vão desde a motivação pela vingança, à gestão oportunista de ganhos financeiros ou à tentação pelo fechamento e o protecionismo para fazer face à onda de mudança que assola o mundo.
Do meu ponto de vista Trump quer sobretudo iniciar o seu mandato a mostrar quem manda, aplicando a lei do mais forte para criar regras globais de convivência e de mercado que favoreçam os interesses das empresas, dos produtos e dos serviços produzidos ou com cadeias de produção controladas pelos EUA. Aparentemente mediu mal os efeitos colaterais da sua abordagem.
As reações internas não foram as mais entusiásticas, mesmo entre os seus apoiantes, mas mais importante do que isso, a revolta na academia, a potencial fuga de cérebros e investimentos e a quebra de laços de confiança com países terceiros pode por em causa a principal fonte de poder não militar dos EUA, ou seja, a sua paz social, capacidade de inovação, competitividade empresarial e dinâmica económica.
Os impactos negativos sobre países terceiros e em particular sobre a União Europeia (UE) são ainda difíceis de medir, tendo em conta a turbulência e a impermanência flutuante das políticas aplicadas, mas serão fortes e notórios. No entanto, a reconfiguração da ordem política e económica também trará oportunidades.
Em particular, a UE pode reforçar outras alianças dando força à sua matriz multilateral e captar recursos humanos altamente qualificados e investimentos soltos pela drenagem provocada nos EUA pelas políticas abrasivas de Trump, aumentando a sua relevância geoestratégica e contribuindo para uma globalização ética, com poderes mais equilibrados e leis mais focadas no desenvolvimento humano e na sustentabilidade do planeta.