A saúde da democracia
Com as eleições europeias agendadas para 9 de junho em Portugal e num tempo em que a celebração de abril nos transporta para as memórias do muito que a liberdade nos tem legado, refletir sobre a dinâmica da evolução da nossa democracia torna-se fundamental.
Um estudo realizado por uma equipa do Instituto Superior de Ciências Políticas e Sociais (ISCPS) e divulgado pelo Jornal Publico concluiu que, entre muitos outros dados de grande atualidade e relevância, 87% dos portugueses continua a defender a democracia como uma forma governativa “preferível a qualquer outra”, mas também que as tentações para escolhas autocráticas subiram em flecha, levando 47% dos inquiridos a dizer que apoiariam um líder forte designado sem eleições. Outros estudos divulgados recentemente indiciam tendências similares.
Estes e outros números caracterizadores da saúde da nossa democracia são, na minha perspetiva, fruto do aumento da desconfiança entre os representantes e os representados, em larga medida agravada pela aceleração mediática e pela virtualização cada vez maior da intermediação política.
Há alguns anos, no decorrer de uma ação de contactos de proximidade no âmbito de uma campanha, uma senhora abordou-me e tendo começado por me dizer que simpatizava e tinha admiração por mim, informou-me depois que, não obstante essa simpatia, eu não teria o seu voto.
Fiquei curioso e perguntei-lhe porquê, ao que ela retorquiu que sabia quem eu era e o que fazia pelo que via na televisão, e gostava, mas não me conhecia e não votava em desconhecidos. Tentei em 15 minutos de conversa que me conhecesse melhor. O voto, esse é secreto.
Voltando ao quadro eleitoral democrático, se pensarmos no que eram as campanhas há uns anos, feitas de contactos porta a porta, sessões de esclarecimento disseminadas pelo território e cartazes colados em cada esquina e o que são hoje, baseadas em debates entre os lideres, megacomícios para as televisões, redes sociais e outdoors, não podemos deixar de pensar que uma das razões da maior desafeição dos eleitores em relação aos eleitos pode estar exatamente no facto de saberem quem são, com a imagem que lhe transmitem através dos múltiplos canais, mas não os conhecerem.
Como pode a democracia reconquistar a empatia da proximidade, combinando as metodologias tradicionais e a nova realidade incontornável da mediatização e das redes sociais. Debater de forma profunda e alargada este tema e tentar desenhar a aplicar novas soluções é uma prioridade para defendermos a saúde da democracia.