Democracia Barricada
Luis Montenegro foi negligente na forma burocrática como preparou a eleição do Presidente da Assembleia da República e ingénuo ao pensar que poderia lidar com a nova bancada populista com a mesma racionalidade com que se pode lidar com todas as outras. O resultado está à vista. A Democracia portuguesa que já estava sobre enorme pressão, está agora barricada.
Fragilizado pelo arranque trapalhão, que o PS colmatou com grande sentido de Estado, o Primeiro-Ministro indigitado apresentou um Governo que é uma seleção do plantel dos Partidos da Aliança Democrática. A capacidade de recrutamento externo já era baixa e mais baixa ficou com o episódio inaugural da legislatura.
Quem dá o melhor que tem a mais não é obrigado. Conheço a grande maioria dos Ministros e muitos dos Secretários de Estado. Obviamente a sua missão é cumprir um programa que em muitas coisas é diferente daquele que eu defendi e defendo, mas sendo resultado de uma escolha democrática, desejo a todos felicidades para o seu desempenho.
Como aqui escrevi em artigo anterior, considerar que o espectro politico pós 10 de março se traduzia num bloco maioritário de direita liderado pelo PSD e um bloco minoritário de esquerda liderado pelo PS, é uma perspetiva claramente insuficiente para descrever o novo quadro político.
Uma primeira partição implica considerar 3 blocos. O bloco da governação liderado pelo PSD, mas em relação ao qual a Iniciativa Liberal preferiu guardar margem, o bloco da oposição liderado pelo PS, mas com muitas matizes e variantes e um natural esforço dos pequenos partidos para não se deixarem satelizar e um bloco de contestação geral constituído pelos 50 deputados do Chega.
Esta partição cobre toda a representação parlamentar, mas deixa a descoberto a bolsa daqueles que tendo contribuído com o seu voto para o desenho, se sentiram depois desconfortáveis com o resultado e vão optar na próxima oportunidade por dar estabilidade governativa a um dos blocos, libertando assim a Democracia portuguesa da barricada a que está sujeita.
Não sendo razoável esperar uma contestação responsável do Chega, por ser contrária à sua natureza, os portugueses vão avaliar o grau de responsabilidade da governação e da oposição e em particular do PSD e do PS face a essa circunstância.
Responsabilidade não é cedência. É concretização de compromissos. Quem agir mais de acordo com o que se comprometeu com os portugueses nas eleições, liderará o próximo ciclo de uma democracia que desejo de novo fluida e pujante.