Política Quântica – Um “New Deal” Europeu?
Devido a todo o processo de edição a que está sujeita uma revista com a qualidade da “Frontline”, e também pela minha tendência de não deixar para o limite do prazo o envio dos meus contributos, estas crónicas são escritas com alguma antecedência em relação à sua publicação. Faço esta referência porque vou escrever sobre o impacto global dos anúncios, medidas, avanços, recuos e piruetas da administração Trump, cujo padrão de comportamento inicia uma nova era – a era da política da incerteza absoluta, da racionalidade mínima, ou para os mais positivos, da política quântica.
A transformação aos solavancos que se vai assistindo nos Estados Unidos da América (EUA) tem muitos impactos, o maior dos quais será o de valorizar os territórios que oferecem níveis acrescidos de previsibilidade, em particular se essa previsibilidade for escorada em valores partilhados, como é o caso da União Europeia (UE).
Face às ameaças colocadas pela nova administração dos EUA, designadamente de bloqueio ideológico à cooperação, imposição de tarifas comerciais, regras limitativas de mobilidade e outras, a UE pode reagir de duas formas e certamente entre os seus membros haverá defensores das duas opções. Ou se agacha e submete e coloca em risco a sua própria sobrevivência ou aproveita a oportunidade para afirmar as suas diferenças positivas como argumento mobilizador capaz de inverter a drenagem de cérebros e investimentos que tem sido neste século claramente favorável à grande potência americana.
Na minha perspetiva, mais intuitiva que dedutiva, este pode ser o momento para um “New Deal” europeu e para um novo impulso económico, social e jurídico (quântico?) na afirmação da parceria de paz, de liberdade e de humanismo que ainda prevalece na UE.
Já passaram quase 100 anos sobre o momento em que Franklin D. Roosevelt, então Presidente dos EUA, lançou um ambicioso pacote de medidas de resposta à grande depressão de 2029. Foram medidas para um tempo diferente, mas que deram músculo à América quando uma década mais tarde foi chamada a defender a Europa e o mundo da ameaça nazi-fascista.
Como poderá ser um desenhado um “New Deal” europeu à luz da realidade do primeiro quartil do século XXI? A plataforma base tem que ser o que diferencia a UE; a dimensão do mercado único, a capacidade diplomática, o ADN multilateral e os valores partilhados.
E como é que tudo isso, que muitos qualificam como raízes da tralha burocrática e regulatória, se pode transformar em valor acrescentado e força competitiva? Será necessária uma abordagem transversal em que a aposta no conhecimento, na tecnologia, na inovação e na literacia empodere em simultâneo os indivíduos e as comunidades, criando contextos seguros, sustentáveis e atrativos.
Sei que o que proponho é mais fácil de enunciar do que de fazer. Mas a motivação do que pode acontecer caso não seja feito, faz-me acreditar no caminho. Foi sempre em contextos de crise que a Europa despertou.