Ouvir, Envolver, Decidir
A sociedade mudou, os hábitos transformaram-se, as próteses cognitivas tecnológicas e a fortíssima mediatização tornaram mais voláteis as perceções dos cidadãos, as suas visões do mundo e as suas motivações para decidir.
Mudando o contexto social, a forma de exercer a nobre função de gestão da “Polis”, num quadro cada vez mais complexo, quer na resposta aos desafios globais, quer na resolução dos problemas de proximidade, também tem que mudar, para continuar a cumprir o objetivo maior da Política, em particular da política exercida segundo um modelo democrático e representativo.
Os estudos mais recentes nas sociedades democráticas demostram que se tem agravado a desconfiança dos cidadãos em relação à política e aos políticos, em relação à fiabilidade das suas promessas e em relação à integridade das suas ações. Embora parte desta perceção seja resultado da desinformação propalada pelos populistas, ela não faria o dano que faz se não tivesse um fundo de verdade. É urgente por isso trabalhar mais para reconectar os cidadãos com a política, nos seus diversos patamares.
Depois de vários anos em que exerci mandatos no Governo da República, no Parlamento Nacional e no Parlamento Europeu, esforçando-me sempre por não perder o contacto com a realidade e com as expetativas de quem pelo voto legitimou essas minhas missões, voltei agora à minha casa de origem, como professor na Universidade de Évora, o que me tem permitido um tipo de contacto diferente, mais direto e mais profundo com os meus concidadãos.
Sobretudo na proximidade do meu escalão etário as pessoas reconhecem-me e são normalmente simpáticas e empáticas, aproveitando sempre que podem para dar voz àquilo que as preocupa, em particular no seu dia a dia, identificando problemas, sugerindo soluções ou protestando contra o que acham estar errado.
Ouvir é o primeiro passo para a reconexão e abre uma janela, não apenas para conhecer melhor a realidade, mas também para convidar quem nos fala a não ser indiferente ao processo de solução e em envolver-se na vida comunitária para além do ato nobre do voto.
Sem funções políticas executivas, tenho procurado multiplicar o dialogo ativo, mesmo com quem só quer protestar, na esperança do quebrar a indiferença em relação ao desenho do que é preciso fazer e refletir sobre como poderia ser possível tomar as decisões necessárias e resolver os problemas identificados.
A minha convicção é que no triângulo ouvir, envolver, decidir, está a chave do tesouro para robustecer a democracia participativa e reconectar os cidadãos com a política.