O Oxigénio de Kamala
Não é a primeira vez que o fenómeno acontece e espero que não seja a última. De quatro em quatro anos todos os que no mundo livre vivem intensamente a política global vestem a pele de americanos e participam com entusiasmo no debate e na reflexão induzidos pela grandiosidade e pela importância da eleição do Presidente dos Estados Unidos da América, mesmo sabendo que vestir essa pele não lhe atribui obviamente o direito a votar, se não forem parte do colégio eleitoral.
Não sou exceção. Depois de alegrias como as vitórias de Clinton, Obama ou Biden e desilusões como as derrotas de Kerry, Al Gore e sobretudo de Hillary Clinton perante Trump, tenho acompanhando com cada vez mais proximidade a contagem decrescente para um duelo que pode ser existencial para o sistema democrático americano entre o regressado Donald e a revigorada Kamala Harris.
O oxigénio com que Kamala recuperou a esperança dos Democratas para a eleição de 5 de novembro tem múltiplas origens. Neste texto focarei sobretudo duas dimensões; a perceção geral e o foco económico.
Com a aposta na designada economia de oportunidades, a candidata do Partido Democrata tem ensaiado uma forte tentativa de recuperação das classes médias com medidas certeiras no acesso aos cuidados de saúde, no apoio na habitação, na equidade dos impostos e no controlo da manipulação de preços em bens essenciais.
A reação do governo americano para recuperar do Covid19 e dos impactos da guerra, liderada por Biden e Kamala foi musculada e dirigida sobretudo à modernização das infraestruturas e à promoção da economia verde, mas do ponto de vista social, os muito ricos beneficiaram bem mais do que a classe média. É isso que Kamala quer agora corrigir.
No domínio da perceção geral, numa América a transbordar de encapsulados nas seitas e nas teorias da conspiração, Kamala aposta na liberdade individual, nos direitos das mulheres, na convivência e na inclusão multirracial e num sentimento geral de alegria do qual o seu riso franco e histriónico se tornou um símbolo.
Escolheu também para a acompanhar como candidato a Vice-Presidente um governador progressista, concretizador, popular, com uma carreira política feita a pulso e com muito mérito pessoal.
Uma América mais justa, plural e reconciliada consigo própria e com a vida, será também uma América menos dependente dos grandes titãs das plataformas tecnológicas que (com exceções) tudo têm feito para catapultar Donald para o Capitólio.
Que as americanas e os americanos escolham em liberdade o melhor para o seu País e para o mundo.