A (boa) Rede
A humanidade deve o seu progresso a múltiplos fatores, mas é consensual entre os especialistas que no plano prático a grande vantagem competitiva da nossa espécie foi e continua a ser a capacidade colaborativa.
A aceleração tecnológica induzida pela Internet fez-nos a todos acreditar que a colaboração acrescida, potenciada pelas novas redes de informação e conhecimento, iriam criar condições para melhorar a democracia, promover a inovação, reduzir as desigualdades e permitir à humanidade dar passos positivos de progresso e desenvolvimento sustentável.
Sabemos hoje que não foi isso que aconteceu. A velocidade e a capacidade de recolha, armazenamento, tratamento e transmissão de dados escancararam a bifurcação intemporal entre o bem e o mal. A colaboração entre indivíduos, comunidades ou organizações não é boa por natureza. Depende do propósito com que é feita, tal como a classificação entre o que é bom e o que é mau depende dos interesses, pontos de vista e valores dos que nela são envolvidos.
Como explicita de forma detalhada Yuval Harari, no seu mais recente livro de grande impacto – Nexus – História breve das redes de Informação ( Elsinore – Setembro 2024), o desenvolvimento tecnológico acelerado que permitiu conectar de forma cada vez mais rápida e alargada os agentes da sociedade e multiplicar as redes colaborativas, revelou em realidade aumentada a dicotomia entre o que é positivo e o que não é, fazendo do conhecimento, dos valores e do propósito, os pilares essenciais do nosso tempo e do nosso futuro coletivo.
Como nos apercebemos em cada dia que passa, o facto de haver mais informação a circular nas redes, tanto ajuda a inovar e a resolver problemas antes inacessíveis, na politica, na economia, na saúde, na educação e em tantas outras áreas, como promove e agrava outros tantos, em particular quando a informação é manipulada, distorcida ou desenhada para conduzir a interpretações contrárias à liberdade, à fraternidade e à dignidade das pessoas e conduzir à destruição da diversidade, dos habitats e da sustentabilidade do planeta em que vivemos.
Falo com muitas pessoas que estão assustadas com o impacto da Inteligência Artificial (IA) nas suas vidas. A minha convicção é que são as suas vidas que vão determinar se a IA será uma ferramenta ao serviço da humanidade ou se será a humanidade a submeter-se à nova linguagem.
A formação e o debate sobre a tecnologia e os seus impactos têm que estar na praça pública. Somos nós que podemos escolher a boa rede ou soçobrar na rede má, e temos que estar preparados para isso.