Comunidades
Perante um mundo crispado e dilacerado de conflitos, guerras, catástrofes e ódios, é normal que os que não se resignam apelem a um sentido de comunidade que permita resolver os problemas com diálogo, contribuindo para mitigar as razões de fratura e maximizar os fatores de ação colaborativa, característica que permitiu ao longo dos tempos a evolução do Homem e da Humanidade.
Em qualquer dicionário de português são muitas as definições de comunidade, sobretudo se associadas a uma tipologia específica de objeto comum. No seu sentido mais liminar uma comunidade é um conjunto de pessoas que vive em comum e cujos recursos não são propriedade individual de nenhum dos seus membros.
À medida que a vida em comunidade se foi tornando mais complexa, aos recursos comuns foram sendo somados recursos e interesses particulares, que ainda assim, nas comunidades saudáveis, beneficiam da colaboração e das regras partilhadas, para gerar contextos de segurança e realização coletiva.
Num sentido alargado a humanidade é uma comunidade que vive em comum no planeta terra. A partir dessa comunidade maior o mundo organiza-se em biliões de comunidades, quais células, cuja infeção de desinformação, desigualdade e agressividade pode ser mortal e cuja cura de diálogo, compreensão e cooperação pode constituir o passo redentor porque tanto ansiamos.
No plano nacional, europeu e global temos vindo a assistir, por parte de alguns atores políticos, a uma progressiva substituição das estratégias de diálogo e ação colaborativa na solução dos desafios mais ou menos complexos do dia a dia das sociedades, por reações polarizadas e fraturantes que destroem o próprio âmago das relações comunitárias e a confiança estruturante da vida em comum.
A sequência de acontecimentos que decorreram da morte de Odair Moniz no Bairro do Zambujal, atingido por um tiro de um agente da PSP em circunstâncias ainda sob investigação, o descalabro de coordenação no socorro às vítimas da tempestade DANA na Comunidade Valenciana ou a vitória da estratégia de medo e de desinformação de Donald Trump nos Estados Unidos, são sintomas de uma doença grave que está a dilacerar a vida em comunidade, a agravar as desigualdades e a reduzir cada vez mais o perímetro da liberdade, em todas as suas dimensões.
À dimensão em que podemos atuar temos que tirar as lições. As tecnologias não cumpriram a promessa de potenciar o diálogo, nem a poderiam cumprir porque são ferramentas. Mas nós podemos fazer a diferença tornando mais fortes as nossas comunidades, para dialogar, colaborar e fazer acontecer.