Eleitoralista por Natureza
Nas minhas ultimas crónicas neste espaço tenho expressado a minha profunda preocupação com a qualidade e com a sobrevivência da democracia representativa e com a capacidade do governo exercido pelo povo, através de quem livremente elege,resistir ao radicalismo, ao extremismo, ao populismo, à desinformação e à desesperança que alastram pelo mundo e também contaminam Portugal.
De entre os pilares mais fortes dos regimes democráticos, a pluralidade e a diversidade assumem um papel crucial. Através deles cria-se o contexto para poderem ser representadas as múltiplas perspetivas, opiniões e interesses que se constituem como partes do tecido económico, social e político de uma sociedade aberta e saudável.
A liberdade declina-se múltiplas liberdades, designadamente na liberdade de escolha política no quadro constitucional vigente. A qualidade da escolha, seja ela qual for, depende da literacia política de quem escolhe e da capacidade das alternativas apresentarem propostas claras e honestas, possíveis de implementar e que não constituam armadilhas emocionais para capturar votos sem compromisso.
Há muitos momentos em que os cidadãos podem exercer as suas escolhas de forma direta ou indireta. As eleições constituem o mecanismo mais estruturado para o exercício da livre escolha das políticas e dos seus mandatários. Uma boa democracia é eleitoralista por natureza, porque as diferentes forças concorrentes têm o objetivo de vencer as eleições. Se as propostas a sufrágio forem sérias fortalecem a democracia. Se forem falsas ou manipuladas não são eleitoralistas, são mentirosas e danosas para a saúde democrática.
Toda esta reflexão foi-me suscitada pelo facto do líder da oposição em Portugal, Luis Montenegro ter considerado eleitoralistas as medidas apresentadas pelo governo na sua proposta de Orçamento de Estado para 2024, por conterem uma substantiva redução de impostos em particular para os mais jovens e os mais vulneráveis.
Ora Montenegro tinha vindo a propor uma redução da carga fiscal! Ao verificar o OE poderia ter considerado a redução nele incluída insuficiente ou mal direcionada. Ao escolher considerá-la eleitoralista, confessou implicitamente que preferia que os impostos não fossem aliviados, para assim ter mais hipóteses de conquistar votos de descontentamento. Apostou na alternância e não na alternativa e esqueceu-se das pessoas em concreto. Não foi estadista. Dificilmente terá uma segunda oportunidade para causar uma primeira boa impressão.